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Os Estados Unidos fecharam nesta terça-feira um capítulo importante em sua história racial, o pecado original do país. O tribunal do júri de Minneapolis declarou culpado o ex-policial Derek Chauvin, 45 anos, pela morte do afroamericano George Floyd, 46 anos, em meio a uma prisão brutal em 25 de maio do ano passado na cidade. A tragédia, ocorrida em plena luz do dia e filmada por transeuntes, deu a volta ao globo e desencadeou uma mobilização global contra o racismo, tornando este mais do que um julgamento de um homem e mais do que um veredicto. Em um país com poucas sentenças condenatórias a forças de segurança, para muitos ativistas, a sentença poderia se tornar um ponto de inflexão na longa história de brutalidade policial contra os negros.
Assim que a sentença foi lida, os gritos de euforia começaram próximo ao tribunal e no cruzamento de ruas hoje conhecido como “Praça George Floyd”, local onde Chauvin o matou. A tensão e os protestos marcaram esse processo que deixou os Estados Unidos em suspense.
As deliberações duraram menos do que se poderia esperar. O júri, composto por sete mulheres e cinco homens de diferentes raças, reuniu-se durante 10 horas entre a segunda-feira e terça à tarde para chegar a um acordo por unanimidade. A dureza das imagens, os nove minutos de agonia de Floyd sob o joelho de um agente impassível, tiveram um papel importante neste processo e no estupor mundial que o caso despertou. Na história estará escrito o nome de Darnella Frazier, a jovem então de 17 anos que gravou todo o episódio e, com certeza, mudou o desfecho que parece selado nesses casos.
Em 25 de maio, uma patrulha policial se dirigiu a uma loja no sul da cidade após a notificação de que um cliente tinha pago por tabaco com uma nota falsa de 20 dólares. Era Floyd, de 46 anos, que continuava em um carro estacionado em frente à loja. Para superar sua resistência inicial, Chauvin o imobilizou no chão, com o apoio de outros dois agentes e então ocorreu esse desdobramento fatal. O joelho de Chauvin apertava o pescoço de um homem negro que não se mexia mais, que implorava que não conseguia respirar e logo depois parecia morto, sem que Chauvin removesse a pressão nem atendesse às queixas dos transeuntes, impotentes e desconcertados.
Durante três semanas de julgamento, pelo tribunal do condado de Hennepin, onde fica a cidade de Minneapolis, alguns dos transeuntes estavam entre as 45 testemunhas. “Usem o bom senso, acreditem no que seus olhos viram, vocês viram o que viram”, disse o promotor Steve Schleicher. Este processo, sublinhou, “não é contra a polícia, é um processo a favor da polícia”. Chauvin “traiu seu distintivo, abandonou seus valores e seu treinamento e matou um homem”, acrescentou.
O policial, que foi demitido, era acusado de homicídio doloso em segundo grau, assassinato em segundo grau (implica intenção no instante, mas não premeditação) e assassinato em terceiro grau (definido em Minnesota como o cometido por alguém que, embora não tenha o objetivo de matar, causa a morte agindo de forma perigosa, com uma “mentalidade depravada” e sem se importar com a vida humana). Seus dois companheiros também aguardam julgamento, embora por delitos menores.
O “caso Floyd” desencadeou a maior onda de protestos antirracismo nos Estados Unidos desde o assassinato de Martin Luther King e provocou uma verdadeira catarse nacional. Empresas e instituições, até mesmo o próprio Pentágono, fizeram um novo exame de consciência sobre a carga racial de seus símbolos e a glorificação dos emblemas da América confederada e escravista. Desta vez quem morreu não era um líder dos direitos civis, mas um homem com uma vida complicada, com um passado na prisão e um presente com problemas com drogas, que abalou os Estados Unidos, e justamente isso resultou em um debate mais profundo, sobre todas as probabilidades que um homem negro tem em relação a um branco de terminar à margem da sociedade e morrer sob o joelho de um policial. É raro no país um tribunal condenar um policial no cumprimento do serviço.